Era domingo. Aliás, não era domingo, era uma terça com ar de domingo, já que feriado. Detesto domingos, mas decidi que não odiaria aquela terça disfarçada. Afinal, ela não tinha culpa de ter aquela cara.
Pois bem. Para cumprir minha promessa, resolvi fazer algo diferente. E considero “diferente” para mim, pois o mesmo passeio se faz comum para muitos! Enfim, fui ao zoológico.
Graças às chuvas do mês de junho, tudo estava por demais verde, apesar de enlameado. As gotículas brilhavam bravamente dependuradas nos arbusto, emprestando às folhas um certo encantamento. Mas este atributo se resumia às plantas. É que os animais, molhados, não pareciam nada encantados! Não sei se por frio ou tristeza, muitos tremiam e, apesar da diversidade das espécies, todos possuíam algo idêntico: o olhar opaco.
Era um olhar de quem pede, de quem pode, mas não sabe o que pede nem o que pode. Era um olhar de quem, mesmo vivo, morre. A prisão faz destas coisas. E eles, por detrás das grades, me pareceram menos ferozes. E eu, defronte às grades, mais covarde.
Indignada – comigo e por eles – me questionei como poderia ter imaginado ser aquele um passeio divertido? Na seqüência de minhas constatações, notei que aquele pesar mórbido ostentado por cada animal duplicou meu próprio peso e eu, arrastando os derradeiros passos, tentei sair dali...fugir.
Entretanto, antes de atravessar o portão, uma última pergunta: haveria um motivo exato para aquela tristeza que, contrariando a natureza do sentimento – que aprendi desde sempre abstrato –, me pareceu palpável? E a resposta me veio mais rápido do que o último passo: sim! Aquela amargura se devia a um simples fato: àqueles animais se impõe a mais severa e cruel missão. A de represar a própria natureza e sucumbir ao desejo do “sim”, na obrigação do “não”.
E chegar a esta conclusão, longe de me aliviar, intensificou minha angústia. É que, mesmo saindo do zoológico, eu continuaria a captar, dali em diante, aquele tipo de olhar em muitas pessoas que, feito aqueles animais, represam sua natureza, lutando contra si mesmas. Mas com uma sutil – e esmagadora – diferença: as grades são suas próprias mãos, sua própria carne, seus articulados “nãos”. E as chaves elas mesmas giram por fora de sua única prisão: o coração.
Lamento profundamente por esta “espécie” humana que, apesar do avançar dos séculos, nunca entra em extinção. Mas, aqueles compõem tal categoria que me perdoem. É que, ainda que me fira mortalmente, transpassarei sempre às grades para estar – e muito – longe do habitat onde eles, ilusoriamente, insistem em viver para sempre.
E foi com esta convicção que encerrei meu domingo...aliás, minha terça-feira, feriado. E que venham os sábados!
3 comentários:
A cada dia minha admiração por vc aumenta, tenho um orgulho muito grande em ser sua Amiga.
Te amo!!!
Humano, humanidade, humanista, etc. Animal, animalesco, etc. Antes do Aurélio Buarque, alguém definiu a que tipo de ser se aplicariam tais acepções.Certamente alguém que desconhecia tudo dos habitantes da terra.Todos fomos inseridos nessa lógica perversa. Perdidos, seguimos negando nossa natureza. Se ousamos nos libertar, nem sempre nos reconhecemos no outro "semelhante"...Lou
...Quicá um dia abandonar essa humanidade cercada com arames farpados para conseguir enxergar a a animalidade que existe em mim... a afeição, a compreensão, a forma de amar, a lealdade na luta, a graça dos bichos, e assim poder aproximar-me para referenciá-los. Marina, definitivamente o zoológico não é mesmo um bom passeio. Com um olhar de reconhecimento, Lou
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