sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

R.I.P


 
Como quem revisita cenários de infância, quis retornar a meus primeiros contos, onde realmente nasci para esta vida.

No portão, que abri com vagar, a pressa se debatia: queria porque queria encontrar o que lá, outrora, havia.

Curiosa, saltei por alguns parágrafos, ladrilhos mal apoiados, escorregadios; atônita, revivi alguns verbos mal conjugados, espalhados por canteiros de flores cinzas; impaciente, percebi nas entrelinhas, na antessala, pobreza de retórica e previsibilidade de falas; cansada, faminta, alcancei a sala de jantar e cozinha, sem me servir de nada, pois nada me servia; descrente, parei à porta do quarto, deixando as personagens e fome de fora. De lá, resolvi voltar. Dei por finda a viagem. A derradeira porta, que fique trancada, como trancado deveria ter deixado o portal que me trouxe até aqui.

O tempo, por vezes, exige linearidade para ser real e eu – não sei como! – apenas agora percebi.

No retorno confuso, bifurcado, a lição: não se deve voltar a cenários de infância com os olhos de agora. Jamais se vê no presente o brilho e encantamento de outrora. É preferível morrer com a lembrança de algo que parecia bom a desembrulhar, no presente, passado incolor, que já não satisfaz.

Portanto, eu os liberto de minhas pretensões, queridos contos antigos, porque esquecidos. Que cada um de vós – junto comigo – descanse em paz.

 

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