quarta-feira, 30 de março de 2016

ENTREMEIO


 
 
De luz e sombra somos feitos
Translúcidos, difusos, escuros
Tudo ao mesmo tempo
Sim, não, talvez
Em um momento
Frações de inteiro
Inteiros de fração
Terreno inóspito e pleno
Que se estende eternamente
Inundado e seco
Do imperfeito à perfeição.

segunda-feira, 28 de março de 2016

SOBRE SALMÕES E NADOS




Meu Deus,
Fizeste-me um salmão!
E não é piada
Eis a justificativa:
Não nasci com guelras,
Nem barbatanas,
Tampouco escamas rosadas;
Mas com uma tendência infinda de nadar contra as águas
E isso me caracteriza

Ainda sofro com os humanos e animais à margem das ruas e da vida, para tantos invisíveis;
Ainda creio que a porta da escola deveria ser aberta antes da do presídio;
Ainda tento explicar que o amor que sinto não é melhor nem pior do que o amor dos casais híbridos;
Ainda Te vejo como um Pai e não um carrasco cheio de rancor e vícios;
Ainda me sinto sua filha apesar de tantos desdizerem, com olhares insanos, isto.

Como salmão que sou, continuo nadando contra as águas
Ao olhar para trás, sorrio
Que bom que a cada braçada me distancio de certos "humanos"
Que nadam sempre sobre seus enganos
Sem antever a mínima centelha
De que, adiante, há uma cachoeira.

segunda-feira, 21 de março de 2016

PÁSCOA




Eu vi um coelho na jaula
"Vende-se"
É Páscoa
O coelho teve preço,
Foi passado no cartão de crédito em três vezes,
E logo teve casa,
Comida,
Pseudo-amor.

Eu vi um coelho na calçada
Abandonado
O branco do pelo,
O vermelho do sangue,
O carro o traspassou.
Foi partido em mais de três pedaços,
Sentiu dor,
Debateu-se tentando renascer,
Mas teve um fim
É que a Páscoa também terminou.

terça-feira, 15 de março de 2016

FLEXIBILIDADE



Não quero mais cordas de aço
Embora ecoem mais alto,
Exuberantes,
Machucam.

Para tocar a vida,
Quero as de náilon,
De som mais baixo
E beleza mirrada,
Mas que, a gravidade, também atenuam.

Ando cansada das guerras,
Dos alardes,
Das ruas.
Quero um acordo de paz,
A clave mais doce,
A nota suave,
O timbre perfeito,
Um dueto.

Só por hoje,
(Finjo um domingo, tenho direito)
Troco o aço pelo náilon,
As espadas pelas plumas,
A desconfortável imensidão pelo berço estreito.

E exalto a flexibilidade,
Esse pêndulo entre vontades,
Que dói menos
Da ponta dos dedos
Ao fundo do peito.

quinta-feira, 10 de março de 2016

A-NORMALIDADE



Amei uma igual E dilaceraram meus sonhos, Rasgaram meu nome, A-normalizaram meu gosto. Das farpas, fiz agulhas Das intrigas, linha De meu orgulho, pontos Costurei-me outra Não marionete do mundo: Dona. Mesmo refeitos, Dispensei os sonhos, Concretizando-os Meu nome? Restaurei, dando-lhe complemento Meu gosto? Continua o mesmo A anormalidade é de quem não vê Que amar não fere, Não ofende, É o maior dos presentes, Senhor dos risos, não dos prantos, Torna-nos mais fortes, Inteiros, Valentes. Por isso Amei uma igual E, por ser o meu normal, Continuo amando.

quinta-feira, 3 de março de 2016

PARA A POSTERIDADE



Num canto do passado:
Um café,
Uma despedida,
Duas vidas,
Numa tarde.
E o que restou intacto,
Senão os móveis de um belo cenário?
 
Local da foto: Museu do Estado de Pernambuco - MEPE