Enquanto o tempo respira,
Insufla-se o mundo de caos
A poeira tinge as ruas e as almas
Há lama nas calçadas
Cinzas de hipocrisia dançando no ar
Enquanto o tempo respira,
Insufla-se a TV de noticiários
“Vísceras das vítimas cheiram mal”
“Intolerância metralha os que buscam igualdade”
Mortalhas para vestir os desfechos do jornal
E inquietude para quem deseja calma
A violência não muda de canal e nos invade
Já não há portas nas casas
A vida vira vitrine e nós, manequins
Verdadeiros fantoches manipulados
A moda muda antes de a fome passar
E as faces tornam-se cada vez mais magras
Covas nos rostos e nos quintais
Corpos que andam, outros que se escondem
Ou são escondidos
Cadáveres mortos e vivos
Sepultados dentro e fora de nós
E haja negrume para encobrir tanta maldade!
E haja estrumo para soterrar tantos bandidos!
Enquanto se espera uma camada de cal,
Enquanto se espera uma camada de paz,
Enquanto se espera o branco,
A vista se turva
A vista se encurta
Enquanto se assiste o Fantástico
Show de tudo o que se tornou banal
E quando o domingo finalmente acaba,
Dorme-se na espera de uma nova segunda
Sonha-se na espreita de um novo mundo
Estica-se o corpo sobre a cama e sobre o caos
Enquanto o tempo respira
(E não para de respirar!)
Morremos aos poucos,
Sem ar e sem rumo
O que fazer do que foi feito?
Desligar?